Sem comprovação científica contra a Covid-19, túneis de desinfecção podem causar alergias e lesões

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Mesmo sem comprovação científica no combate ao novo coronavírus, as estruturas de desinfecção (câmaras, cabines ou túneis) continuam se proliferando pelo País e, em alguns casos, são até exigidas pelas prefeituras em locais de grande aglomeração, como shoppings centers, edifícios comerciais e rodoviárias. “A própria Anvisa reconhece que essas estruturas não têm eficácia para a inativação do vírus. Pior do que isso, alguns produtos aspergidos podem fazer mal à saúde”, explica Paulo Engler, diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Higiene, Limpeza e Saneantes de Uso Doméstico e de Uso Profissional (Abipla).

A Abipla tem analisado essas estruturas desde que elas surgiram no Brasil. Em abril, por exemplo, elaborou nota conjunta com o Conselho Federal de Química (CFQ/CRQ), questionando a eficácia desses equipamentos. A resposta da ANVISA veio em maio, por meio da Nota Técnica 38/2020, em que a agência sanitária afirma que o equipamento não é recomendado por nenhuma das principais agências reguladoras de saúde do mundo. “Não foram encontradas recomendações por parte de órgãos como a Organização Mundial da Saúde (OMS), Agência de Medicamentos e Alimentos dos EUA (FDA) ou Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC) sobre a desinfecção de pessoas no combate à Covid-19, na modalidade de túneis ou câmaras. Igualmente, não existe recomendação da Agência Europeia de Substâncias e Misturas Químicas (ECHA) nesse mesmo sentido”, diz o texto.

Mesmo com o alerta da ANVISA, muitos locais públicos vêm recebendo os equipamentos e, em alguns casos, como obrigatórios pela legislação local. “Enviamos ofícios para diversos municípios, que passaram a utilizar tais túneis e cabines, mas, a maioria tem ignorado nossas recomendações e a Nota Técnica da ANVISA. A Câmara de Vereadores de São Paulo, por exemplo, já deu parecer de legalidade ao Projeto de Lei 365/20, que autoriza o uso desses equipamentos, inclusive colocando sua instalação como parte das exigências legais, para obtenção do alvará de funcionamento”, afirma Engler.

Por que não funciona?

Mesmo que os produtos utilizados nessas estruturas sejam aprovados pela Anvisa, o tempo de exposição – geralmente, de 20 a 30 segundos – não permite que o saneante complete o processo de desinfecção, pois alguns exigem até 10 minutos de contato direto com a superfície para serem efetivos. “Um problema adicional é que a utilização dessas estruturas pode dar, às pessoas, uma falsa sensação de segurança e, desse modo, levar ao relaxamento das práticas de distanciamento social, de lavagem das mãos frequente, com água e sabonete, de desinfecção de superfícies e outras medidas de prevenção”, diz a Nota Técnica da Anvisa.

Além disso, os saneantes foram aprovados, exclusivamente, para limpeza de superfícies. Dessa forma, alguns deles podem provocar reações alérgicas e até diminuir a capacidade natural da pele humana em combater micro-organismos prejudiciais à saúde, se entrarem em contato direto com mãos e mucosas. “O hipoclorito de sódio, por exemplo, é um produto corrosivo. Pode causar lesões na pele e nos olhos, além de problemas respiratórios. Outros produtos que vêm sendo utilizados, os quaternários de amônio, apesar de não serem corrosivos, podem provocar reações alérgicas. Como temos alertado desde o surgimento dessas estruturas, os produtos saneantes, aprovados pela Anvisa, são, totalmente, seguros, desde que utilizados da maneira correta, ou seja, devem ser aplicados em superfícies fixas e inanimadas, como bancadas, pisos, paredes e objetos, mas nunca diretamente nos seres humanos”, diz Engler.

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