Por Symone Miguez
PhD Delft University of Technology, ergonomista sênior certificada pela ABERGO, fisioterapeuta, e soma 25 anos de experiência em gestão ergonômica e consultoria empresarial
Nesta edição, trago para você informações sobre a tecnologia de captura de movimento — e saber do que se está falando é fundamental. Então, vamos começar pelas definições desta tecnologia.
A tecnologia de captura de movimento (ou motion capture, em inglês) é um conjunto de técnicas e ferramentas utilizadas para registrar os movimentos de pessoas ou objetos no espaço tridimensional, utilizando sensores, câmeras ou marcadores para capturar e analisar os movimentos corporais em tempo real. Os dados coletados podem ser usados para criar modelos digitais que representam com precisão a dinâmica dos movimentos — o que é muito útil para diversas áreas, como a ergonomia.
Como funciona a captura de movimento na ergonomia:
A captura de movimento é usada para analisar como as pessoas se movimentam enquanto realizam suas atividades de trabalho ou atividades diárias. A tecnologia pode ser aplicada em cenários como:
-
Monitoramento de posturas: sensores ou câmeras registram a postura do corpo e movimentos repetitivos. Isso permite identificar posturas extremas ou movimentos que possam ser prejudiciais à saúde do trabalhador.
-
Avaliação de movimento e esforço: a captura de movimento permite medir a amplitude de movimento, a velocidade e a precisão dos gestos, identificando sobrecarga física ou padrões de movimento potencialmente prejudiciais.
-
Simulação e design de postos de trabalho: com dados precisos dos movimentos dos trabalhadores, é possível ajustar o design de cadeiras, mesas e outros equipamentos de trabalho para reduzir o esforço físico e melhorar a postura.
Quais os benefícios para a ergonomia:
-
Análise precisa de posturas e movimentos: a captura de movimento fornece dados extremamente precisos sobre a postura e os movimentos das pessoas durante as atividades, auxiliando os profissionais de ergonomia a identificarem padrões problemáticos que podem não ser visíveis a olho nu.
-
Prevenção de Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT): ao monitorar a biomecânica dos trabalhadores, é possível detectar posturas incorretas ou movimentos repetitivos que podem levar a distúrbios musculoesqueléticos. Com esses dados, podemos sugerir mudanças de comportamento ou ajustes no ambiente de trabalho para prevenir DORT.
-
Ajustes em tempo real: ao usar a captura de movimento, é possível fazer ajustes em tempo real no ambiente de trabalho. Por exemplo, ao observar que um trabalhador está fazendo um movimento inadequado ou causando tensão muscular, pode-se rapidamente recomendar ajustes na altura da cadeira ou na posição da tela do computador, melhorando a postura de forma imediata.
-
Aprimoramento da ergonomia no design de produtos: empresas podem usar dados de captura de movimento para projetar ferramentas, equipamentos e móveis mais adequados às necessidades fisiológicas dos usuários. Isso pode envolver, por exemplo, o design de controles de máquinas ou cadeiras de escritório que favoreçam o movimento natural do corpo e reduzam o esforço físico.
-
Treinamento e feedback visual: a tecnologia oferece feedback visual sobre a postura e os movimentos, ajudando os trabalhadores a visualizarem o que estão fazendo de errado e aprenderem a realizar tarefas de maneira mais eficiente e saudável.
Mas, como começar a usar esta tecnologia?
Pesquisei e me deparei com a tecnologia de captura de movimento da Movella, uma empresa holandesa. Entrevisei o André Scutti, da Movella no Brasil, para falar sobre o Xsens-Movella. Veja a entrevista a seguir:
1) No que consiste a tecnologia da Xsens-Movella e como ela se diferencia no mercado?
A tecnologia de captura de movimento da Xsens-Movella, integrada ao sistema Industrial Athlete da Scalefit, consiste no uso de sensores inerciais wearables que capturam, em tempo real, as posturas e movimentos do corpo durante atividades laborais. Esses dados são visualizados por meio de um avatar digital e analisados com mais de 20 parâmetros de estresse animados, permitindo uma avaliação detalhada da carga física no ambiente de trabalho.
No mercado, essa tecnologia se destaca por fornecer uma análise objetiva e em tempo real das interações biomecânicas no local de trabalho, superando métodos tradicionais que dependem de listas de verificação analógicas. O foco está em fatores críticos como força, postura e repetição, que são fundamentais na prevenção de distúrbios musculoesqueléticos em ambientes de trabalho físico. Além disso, apresenta cálculos de compressão de discos vertebrais e input de carga, com impacto imediato nos parâmetros apresentados.
Vale ainda destacar que a utilização de sensores para o input de dados aporta uma flexibilidade imensa aos ambientes de coleta e não apresenta oclusão de movimento, mesmo quando há equipamentos ou maquinários obstruindo a coleta — o que é muito comum nas coletas realizadas com câmeras individuais.
2) Quais as referências normativas que foram consideradas no Xsens-Movella e como os cálculos são realizados?
As referências normativas consideradas incluem a norma técnica alemã DGUV 208-033 e algumas normas europeias, como DIN-EN 005-4 e KIM, que são as bases de muitas ISO e, geralmente, mais restritivas. Também são utilizadas NIOSH, REBA, entre outras. Os cálculos de levantamento, sustentação e transporte de cargas são realizados com base na KIM.
Pode-se dizer que o sistema é adequado para avaliação e documentação das condições de trabalho, conforme exigido pelas normas — inclusive brasileiras. Embora as normas utilizadas sejam mais restritivas, é possível fazer alterações de parâmetros livremente no nível do relatório, ajustando limites de angulação, carga ou número de repetições para classificar um risco. Importante salientar que a ferramenta possui validação científica em todos os parâmetros de estresse avaliados, com artigos científicos respaldando os cálculos e os modelos biomecânicos.
3) Em que tipo de ambientes pode ser realizada uma medição? Existem limitações?
As medições podem ser realizadas diretamente no local de trabalho, sem necessidade de ambientes controlados. A tecnologia é projetada para ser utilizada em diversos setores — incluindo indústrias de diferentes segmentos, transporte e logística —, permitindo avaliações ergonômicas precisas em ambientes reais de trabalho, mesmo em postos de difícil acesso, como trabalho em altura ou espaços confinados, por exemplo. A duração das baterias dos sensores é de cerca de 11 horas de uso contínuo.
4) Além da atuação direta em ergonomia, o que mais essa tecnologia pode agregar no âmbito da saúde e segurança no trabalho?
Essa tecnologia pode contribuir significativamente com programas de treinamento em realidade virtual, já que sincroniza perfeitamente com outras tecnologias, como os VR, levando precisão de movimentos ao ambiente virtual. Além disso, por meio da sincronização com hardwares como eletromiógrafos e plataformas de força, é possível analisar em detalhes e de forma aprofundada os ambientes de trabalho e funções específicas, mitigando ao máximo os possíveis riscos e danos à saúde.
Também é possível apoiar processos de digitalização de ambientes fabris, em uma etapa de projeção dos ambientes digitais e sua interação com o ser humano e sua movimentação real.
Sem dúvida, tecnologias como estas estão contribuindo para que as análises ergonômicas sejam cada vez mais precisas.
E você, já está aplicando alguma tecnologia como esta em suas análises ergonômicas ou pesquisas? Quer compartilhar suas experiências?
Envie um e-mail para: syphd17@gmail.com