Por Claudia Carvalho
No mundo corporativo contemporâneo, onde o tempo é um ativo escasso e o bem-estar dos colaboradores se tornou um diferencial competitivo, conscientizar sobre o equilíbrio entre absenteísmo, presenteísmo e presença excessiva (também chamada de presenteísmo compulsório), surge como o fio condutor de uma Ergonomia verdadeiramente transformadora e não cabendo mais o tradicionalismo (mais do mesmo), uma nova abordagem exige uma visão muito mais estratégica, humana e disruptiva, capaz de reconectar empresas e pessoas ao que realmente importa: trazer a saúde, o propósito e o desempenho sustentável.
No ambiente laboral, há uma linha tênue entre estar presente e realmente ser produtivo. O fenômeno do presenteísmo, onde o colaborador está fisicamente no trabalho, mas não em plenas condições produtivas, e o absenteísmo, a ausência frequente no ambiente de trabalho, são apenas a ponta do iceberg. Um aspecto menos discutido, porém, igualmente crucial, é a presença excessiva (ou presenteísmo compulsório) onde aquele colaborador, por achar que pode lidar e dar conta de todas as questões, acaba se sobrecarregando e, ironicamente, expõe-se a riscos ocupacionais, entre as doenças e acidentes relacionadas ao trabalho.
Imaginar um ambiente laboral onde a presença não é apenas física, mas plena; onde o engajamento não é uma obrigação, mas um desejo; e onde o equilíbrio não é uma utopia, mas uma realidade cotidiana. Saber desvendar como a Ergonomia 5.0 pode ser a chave para transformar esses desafios em oportunidades, onde a conexão do corpo/físico, com o mental/emocional, com o psicossocial/biossocial e a espiritualidade organizacional/trabalho, deve ser um fluxo contínuo de crescimento sustentável na saúde das empresas e no bem-estar de seus valorosos colaboradores.
Desafios
Atualmente, o desafio da Ergonomia disruptiva é ir além das tradicionais soluções convencionais. Não se trata apenas de ajustar cadeiras, mesas e equipamentos, e corrigir posturas inadequadas, mas sim, de reconstruir a conexão humana, de criar um ecossistema que inspire os colaboradores a se sentirem valorizados e integrados, criando uma cultura de pertencimento, atuando como um catalisador de propósito para interação da vida profissional e pessoal, onde o maior desafio é transformar o ambiente de trabalho em um espaço onde o colaborador queira estar, encontrando suporte, sem que se sinta julgado.
Os três fenômenos absenteísmo, presenteísmo e a presença excessiva se entrelaçam a um complexo de cenários aos fatores de riscos ocupacionais em relação à Ergonomia de forma integrativa, compreender e considerar estes fatores e fenômenos é fundamental para desenvolver ambientes de trabalho adequados, eficazes e com comprometimento genuíno com a saúde, qualidade de vida, bem-estar e bem viver dos trabalhadores, prevenindo e mitigando não apenas as doenças ocupacionais, mas também os acidentes de trabalho.
O ABSENTEÍSMO é um reflexo claro de que algo não vai bem na saúde dos trabalhadores afetados e afastados por algum tipo de alteração no corpo e na mente, geralmente inicia-se com faltas esporádicas, que com o passar do tempo a ausência se torna frequente do trabalho, e possivelmente culminam em afastamentos prolongados do ambiente laboral.
E o resultado, provavelmente será o aumento da carga de trabalho para os colegas, criando um ambiente de desmotivação coletiva, aumento de custos com substituições, treinamentos constantes, sinalizando o aumento da sobrecarga física e mentalde outros colaboradoresque precisam compensar a ausência, muitas vezes, criando um ciclo de insatisfação e descontentamento generalizados, e acarretando a médio e longo prazo outras faltas e afastamentos, dificultando a retenção de talentos e podendo ser considerada uma epidemia em relação aos riscos ocupacionais da empresa.
No absenteísmo a somatização e a psicossomática são claras, se alinham as afecções do corpo/físico, a desordens mentais/emocionais, as perturbações biopsicossociais e as alterações da espiritualidade organizacional, culminando em enfermidades crônicas, transtornos, disfunções, distúrbios que forçam o colaborador a se afastar sucessivamente do ambiente laboral, podendo evoluir para um afastamento permanente. A subjetividade desses sintomas, muitas vezes, não é compreendida pela organização, pois, é um resultado da carência de um levantamento, mapeado e diagnostico eficiente da empresa, desde os iniciais achados clínico e organizacionais sobre a deficiência da saúde e qualidade de vida dos primeiros trabalhadores, que tiveram muitas faltas e afastamentos.
A compreensão e a implementação de estratégias para combater os fatores de riscos ocupacionais ergonômicos, deve contar com a análise e o alinhamento com este fenômeno absenteísmo, pois, é fundamental para reduzir um ambiente doente e promover um ambiente de trabalho muito mais saudável e principalmente sustentável.
Já o PRESENTEÍSMO exige uma reinvenção da organização do trabalho, pois, há uma falsa sensação de produtividade, o colaborador está fisicamente presente, mas seu desempenho progressivamente vai reduzindo, o que pode comprometer prazos, qualidade dos produtos ou serviços e até a satisfação dos clientes e parceiros de negócios, gerandopara a empresa um impacto no processo produtivo, na integridade financeira e patrimonial, além de dificultar a criação de um ambiente de trabalho saudável e motivador.
Não basta o colaborador estar presente no ambiente de trabalho, é preciso estar em um local físico, alinhando corpo, mente com a bioexistência. O desafio é indicar condições para que o colaborador esteja plenamente engajado, reduzindo as distrações e que favoreça o equilíbrio e controle das situações, assim, aliviando ou mesmo neutralizando possíveis doenças e/ou acidentes no ambiente laboral.
Compreender a urgência de agregar a saúde integrativa ocupacional ao mundo corporativo e saber projetar um desenho de trabalho que favoreça a presença plena e a conexão genuína do colaborador com o ambiente em que atua, é um passo essencial para promover uma cultura de saúde e bem-estar verdadeiramente sustentável. Mais do que prevenir doenças, trata-se de cultivar vínculos, valores, significado e equilíbrio entre o humano e o organizacional.
Reforçando que o presenteísmo, por sua vez, manifesta-se quando o colaborador está fisicamente presente, mas mentalmente distante, muitas vezes lidando com desconfortos, dores e perturbações em relação ao corpo/físico, ao mental/emocional, ao psicossocial/biossocial e a espiritualidade organizacional/trabalho e na somatória de outras questões e preocupações. Essa desconexão pode levar a um desempenho inferior, maior risco de erros e um sentimento constante de frustração e incapacidade.
Enfrentar o presenteísmo requer uma transformação na forma como o trabalho é percebido, muitas vezes é um reflexo do espaço em que o colaborador está inserido, com o sentimento que não pode se ausentar, por receio de ter algum tipo de punição, mesmo quando não está em condições ideais. Isso pode resultar no aparecimento e/ou aumento de doenças ocupacionais, causando uma queda na qualidade vida no e do trabalho, erros que poderiam ser evitados e, em casos mais graves, acidentes que afetariam não só o indivíduo, a equipe e a empresa como um todo, o chamado “efeito dominó”.
Equilíbrio
A Ergonomia 5.0 oferece ferramentas para identificar, mapear e diagnosticar precocemente estas alterações que possivelmente estão atreladas a psicossomática e a somatização das atividades de vida diária deste indivíduo, manifestando muitas vezesde forma sutil, onde suas condições físicas e mentais já começam a limitar seu desempenho. A subjetividade neste contexto está na dificuldade de mensurar o impacto desse fenômeno, muitas vezes resultando em equívocos sobre possível aquisição de enfermidades ocupacionais e acidentes relacionadas ao trabalho e o receio do trabalhador em se expor a condições adversas disciplinares.
Esse fenômeno é tão prejudicial quanto à ausência total do colaborador, pois, o indivíduo permanece no ambiente de trabalho, mas com uma performance comprometida, mitigar os efeitos do presenteísmo, é uma responsabilidade de promover a conscientização e sensibilização da empresa, com seus líderes, gestores e dirigentes sobre a importância do colaborador estar alinhado a presença física, mental e bioexistêncial no ambiente de trabalho.
Em contrapartida, a PRESENÇA EXCESSIVA (ou presenteísmo compulsório), ocorre quando o colaborador se sente compelido a estar sempre disponível e produtivo. Essa cultura de “sempre ligado” leva a um desgaste contínuo que, embora muitas vezes não seja imediatamente visível, podendo resultar em sérias consequências ao longo do tempo, atribuindo o desafio de equilibrar o comprometimento e bem-estar deste colaborador com o ambiente de trabalho.
Este comportamento surge quando o colaborador se “obriga” (consciente e inconscientemente) a realizar alguma tarefa contra a vontade, mesmo sem entusiasmo, motivação ou vontade realou sem o desejo natural, utilizando esforço ou pressão para tal. Implica uma ação que exige um grande esforço físico ou mental, indo além do que seria usual ou confortável, mesmo sabendo que irá além de seus limites. A somatização aqui resulta no aparecimento de questões graves a saúde e maior risco de acidentes. A subjetividade desse fenômeno está no desequilíbrio entre o desejo de performar e a capacidade real do indivíduo, o que pode levar ao esgotamentosilencioso generalizado.
Esse comportamento não só aumenta o risco de possivelmente adquirir transtornos e disfunções relacionados à psicossomática e a somatização, que pode levar a um acúmulo da sobrecarga corporal e mental, dificuldade de amparodo colaborador que está em desequilíbrio devido a procura em demonstrar alta performance no trabalho, agravo por ultrapassar seus valores e propósitospodendo levar a variados tipos de distúrbios, alterações e até doenças multifatoriais.
Muitas vezes a presença excessiva, pode criar um cenário onde o colaborador, mesmo esgotado, sente-se empenhado a continuar atuando sem respeitar os seus limites em relação ao corpo/físico, a mente/emoções, ao psicossocial/biossocial e a espiritualidade organizacional, o agravamento ocorre quando o colaborador não consegue e não sabe se desconectar, impactando na sua saúde como um todo, gerando um ciclo progressivo de exaustão e desmotivação, pois, o colaborador passa a ter dificuldade em se recuperar, sentindo impotente e gerando conflitos interno e externos a ele.
Combater a presença excessiva envolve redefinir o conceito do que são produtividade e cultura organizacional, onde a obrigação de promover práticas integrativas e complementares no ambiente laboral se faz necessário, aprender e incentivar a autoconscientização, e saber respeitar genuinamente os limites humanos.
Para as empresas, a presença excessiva pode parecer, à primeira vista, um sinal de dedicação e comprometimento. No entanto, essa prática leva a um aumento silencioso e gradual de erros, retrabalho e, consequentemente, custos operacionais. Além disso, colaboradores que estão alertas e ligados em excesso tendem a ser menos criativos, inovadores e menos engajados, o que impacta diretamente a competitividade e a capacidade de crescimento da empresa.
O grande desafio é transformar o ambiente corporativo em um lugar onde o sucesso é “medido” não só pelo desempenho, mas também pelo bem-estar e pela satisfação do colaborador de estar realizando suas atividades laborais, saber valorizar a desconexão saudável e estratégica, incluir a expertise de criar um ambiente onde o equilíbrio entre vida profissional e pessoal não seja apenas um ideal, mas uma prática cotidiana, integrando a saúde física, mental, emocional, social e espiritual.
Compreender, mitigar e abordar a presença excessiva com a mesma seriedade que o absenteísmo e o presenteísmo, são fundamentais para criar um ambiente de trabalho sustentável.
No universo da Ergonomia Contemporânea em relação ao absenteísmo, presenteísmo e presença excessiva, não são fenômenos isolados, mas parte de uma mesma jornada humana. Uma pessoa pode transitar entre esses três estados, começando com uma dedicação extremada presença excessiva que busca sentido, ao presenteísmo que clama por conexão, evoluindo para um comprometimento mecânico e, por fim, o absenteísmo que sinaliza a necessidade de mudanças, culminando a um afastamento completo.
A Ergonomia 5.0 considera os aspectos de uma abordagem integrativa e humanizada, oferecendo ferramentas que auxiliam a trilhar esse caminho, promovendo um ambiente que nutre corpo, mente, relações sociais e espiritualidade organizacional.
Uma Ergonomia deficiente e ineficaz pode ser um catalisador de diversas enfermidades ocupacionais, muitas vezes silenciosas, mas profundamente impactantes.
O equilíbrio entre esses fatores e fenômenos se traduz em um desafio estratégico, onde é fundamental encontrar um equilíbrio entre a produtividade e o bem-estar dos colaboradores, redução de custos com saúde e afastamentos, e um clima organizacional mais saudável e engajado. Assim, a jornada não é apenas sobre evitar extremos, mas sobre criar uma cultura de bem-estar que beneficia os indivíduos a prosperarem em todos os aspectos de suas vidas, quanto à organização como um todo, garantindo crescimento sustentável.

Arquivo da autora

Foto: arquivo pessoal
Claudia Carvalho
Fisioterapeuta, Ergonomista, Técnica de Segurança do Trabalho, Terapeuta Integrativa Ocupacional. Treinadora, Mentora e Palestrante. Atua em áreas como Análise Ergonômica do Trabalho, Saúde Integrativa Ocupacional, Análise da Postura Emocional Ocupacional dos Liderados, Desenvolvimento dos Fatores Humanos dos Líderes, Assistência Técnica Pericial em LER/DORT/AMERT, Fisioterapia Preventiva e Curativa.